cais
os momentos vão passando pé ante pé. na verdade podem não ser os momentos, posso ser eu mesmo - já que perdi o controle do que é quem. tá. de toda a forma, avanço. não é fácil, nem eu imaginava.. são portas sem paredes e escadas que não chegam ao solo, é sol azul e o grito, rouco. é a mais retumbante impossibilidade sorrindo como um bebê no aleitamento.
desisti de ler mais sobre o afeganistão. ele está dentro da minha cabeça com balas de festim. absorvo os impactos e sigo adiante como um jogador diligente. tudo mentira. palimpsesto.
é a hora da verdade, da geléia geral tomar forma, a hora de acariciar a moviola sabendo que dela nascerá a fusão perfeita. porque o mundo deveria ser transformado com fusões, jamais os cortes secos da terra árida.
o banho é a rendição. a hora em que nos entregamos de corpo e alma à água que escorre, espreita, penetra em cima, embaixo, na frente, atrás, adiante. a reconstrução de tudo. consegui, voluntariamente, desconstruir toda a minha história e chega a hora de reverter o processo, como uma diáspora às avessas. esse comboio não partirá sem mim, não me permitirei tal omissão.
o menino que mora em mim observa com o olhar guloso a fruta ali, do vendedor da esquina, vai até ele e morde a maçã (e a seda azul do papel que envolve a maçã - sic). a ladeira é íngreme e de paralelepípedos e, por isso mesmo, mais gostosa, atraente ao simples passante que se protege do sol com um guarda-chuvas... eu mesmo que me molho inteiro, chapinho nas poças e busco os canos que despejam água como cantando na chuva.
sempre me vem a imagem de um cais. pequeno. simples, prosaico. o cais onde a canoa e a traineira se encostam e se deixam ao sabor das ondas. piso no ístimo desse cais e caminho até a ponta onde uma mulher, mãos enfiadas no casaco de capuz amarelo, observa o horizonte. posto-me ao seu lado em silêncio e sabemos porquê está no horizonte o que procuramos antes em lagoas escuras ou mares bravios.
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