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25/02/2007

Essa frase de Sartre : "Em suma, namorei o diabo, sem ter coragem para ir até o fim" sintetiza de uma maneira cabal toda a arquitetura da minha existência. não se aprofundar em mim é não me ver... como um cego que, pelo tato, percebe um rosto, pode até imaginá-lo sem o ver de fato. diante de tantos desencontros, resolvi essa semana criar um novo espaço onde vou, diligentemente, passo a passo, fazer um manual de mim.

não sei se estou sozinho nessa excentridade em necessitar de uma bula para que eu não seja ingerido de forma fraca demais, que não faz efeito, nem forte demais que mata não o paciente, mas o próprio remédio. o que aconteceu foi que eu nasci de mim muitos anos depois de ser gestado na barriga materna.

minha mãe foi uma sacola para a minha formação básica. depois eu cresci e reproduzi em outras mulheres os meus filhos. tem tese era para ficar por aí, mas aconteceu uma metamorfose louca e, com uma certa idade, comecei a me reproduzir, a me auto-fecundar em algumas situações de forma externa, mas na maior parte, internamente. deixei então de ser eu, tornando-me uma comunidade cigana, nômade.

nelson rodrigues nunca saiu do rio de janeiro sem prejuízo para a sua proposta. não cheguei a tanto até porque não possuo seu talento. mas não é nada disso.... o que eu fico pensando é nessa aldeia que eu sou, uma aldeia que tem que ser visitada, onde o forasteiro deve antes de tudo pedir a benção ao prefeito para só aí poder transitar pelas ruas junto aos rolos de feno que o vento empurra.

essa situação existencial gerou, como um ilusionista, uma impressão errada. com menos atenção, deixa-se de perceber que tenho/sou um holograma e que tocá-lo não necessáriamente viabiliza colocá-lo no bolso. se fosse só isso, beleza, seria simples de resolver: toca-se e vai-se embora como quem visitou a sala de espelhos truncados de um parque de diversões. é nessa hora que surgem as dúvidas e a tentação da encruzilhada.

reconhecer que sou um holograma de mim e não só um holograma é saltar no escuro. É claro que eu não pretendo que absolutamente ninguém dê salto nenhum, bobagem pensar isso. quem dá os saltos, antes, sou eu próprio. sou insuportável não só por mim assim, de per-si. não.
há quem guarde dentro de si um anjo, o que, evidentemente, não é o meu caso. guado dentro de mim outros.

dentre eles, trago em mim um sísifo. e a confusão aumenta quando tenho que me interiorizar para levar a pedra até o cume da montanha, mesmo certo de que ela vai rolar abaixo pelo outro lado. sento então nesse bar vazio com o paraíso perdido numa edição de bolso vulgar e peço à garçone uma jarra de vinho. isso ficou marcado e definido no meu eu, quando li uns diários de sartre na guerra - "drôle de guerre" - e ele relata sua experiência com o vinho e a garçonete.

mas aí é que está a verdadeira história: isso é insustentável para as pessoas que me pretendem simples. porque a vida é simples, as pessoas são simples e todo mundo quer viver e não ficar numa filosofiazinha barata, jeka, de almanaque... por sua própria situação de bípede pensante, as pessoas com muita propriedade, querem viver, namorar, amar, ir e vir, gozar essa vidinha breve o que, de certa forma, dá continuidade a humanidade.

através dos meus filhos, cumpri uma parte da perpetuação da raça. quanto a mim aconteceu essa experiência desastrada de multiplicação de eus com o agravante do holograma gerado. chego novamente a uma encruzilhada. não dessas simples, mas ao epicentro do terreno vida, de onde partem inúmeros atalhos, vielas, pontes e avenidas. não me furto a escolher uma e seguir ou mesmo voltar e experimentar outra, mas sempre tendo claro que a pedra aguarda que eu a eleve ao cume da montanha que trago em mim. fim.

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Nada encontrado. Seria ousadia demais definir o indefinível, dizer quem sou ou se sou. Deve ser uma miscelânia de idéias entrecortadas, salpicadas de perguntas sem respostas e indecisões doloridas. O que mais poderia ser?

Em suma...

"Em suma, namorei o diabo sem ter coragem para ir até o fim"
Sartre

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