Geraldo Iglesias*

as meninas e meninos que me chamaram ontem para beber levam em consideração apenas algum apreço não exatamente pela minha pessoa, mas, antes, uma admiração pelo que elas acham que eu sou de fato, o que represento.

essa meninada não percebe isso, mistura os seus sentimentos e a coisa toda vira uma espécie de pulsão que pode derivar para vários caminhos. procuro então me manter à uma distância bastante razoável de forma a não ser alcançado em nenhuma investida mais ousada.

o que me diferencia deles é antes de tudo, a idade. eles bebem vinte chopes com toda a tranqüilidade e hoje se chegam a mim como se não tivesse acontecido nada. eu, ao contrário, estou completamente detonado, passando mal, sem forças nem para falar.. não tenho mais idade para beber no mesmo pique deles.

aliás eu não tenho mais nada no mesmo pique deles. o que me conforta é ter esse entendimento óbvio e claro da vida e da minha posição nela, minha trajetória numa espécie de linha do tempo invisível, mas plenamente imaginada. estou lá na frente, já vi e vivi quase tudo, raramente me espanto ou me emociono. realmente não.

eles se drogam, trepam sem cansar, têm ereções fundamentais, embora não tenham muita preocupação com os jogos preliminares que, sabidamente, excitam mais às lobas de 40 anos em diante. essa questão sexual para mim é muito complicada. estou definitivamente no meu ocaso. mas é justo: trepei bastante na minha juventude e meia idade... é natural que agora fique quieto, de fraldões.