levanto agora, três e tanto da madrugada e tudo me parece estranho. achei que ia tirar um cochilo durante a tarde para me refazer de um certo sono incômodo e, na verdade, dormi muito, mas não o suficiente para aguardar a chegada de um novo dia. não há um novo jornal para ser lido e as pessoas, em suas casas dormem o sono dos justos.
tomando chá, josué montello sempre me contava que dormia muito, mas muito pouco, passando as madrugadas inteiras acordado. para não incomodar sua mulher, companheira única de toda a vida, ele dava vazão à sua necessidade de contar histórias num caderno que escrevia diligentemnte, com caligrafia caprichada porque as máquinas de escrever faziam muito barulho nas madrugadas.
durante o dia, enquanto ele cumpria suas obrigações de barnabé, para o Estado, sua companheira datilografava todo aquele material que tornou-se uma obra caudolasa, pontuando de histórias variadas toda a são luis do maranhão e arrabaldes. antes de morrer, sorrindo, ele me confidenciou ter ainda dois livros inéditos, dois romances e ainda o quarto ou quinto volume dos seus diários. até hoje, não vi o lançamento desse material.
sinto aqui essa aragem da madrugada, esse silêncio que os malandros da lapa e as prostitutas se impõem com o rigor de profissionais e o repouso dos que pululam na internet que devem estar exaustos de bites e bytes, buscando num sono de zeros e uns o descanso da tela de seus computadores.
da minha janela, alcanço os prédios vizinhos, todos com suas janelas religiosamente escuras, luzes apagadas em busca do sono que entorpece a vida nessa hora de vácuo, quando não é dia nem é noite.
estou aqui, só no mundo, em frente a esse monitor iluminado que reflete apenas o que teclo, não dando suas respostas autônomas como faz na hora do rush de pessoas que querem falar todas, contar isso e aquilo, conhecer alguém de qualquer maneira como a garantir o fim da solidão nas próximas 24 horas... não, aqui estou só eu e artur que dorme e acorda comigo, vivendo a vida felina de quem se entrega sem esperar nada em troca.
a cafeteira, com seus ruídos desapercebidos durante a balbúrdia, agora mostra que está trabalhando, preparando o bule de café habitual, que consumo sempre ao despertar, café sem igual que acompanha os cigarros que acendo uns nos outros como fazia tatiana memória, diretora do teatro municipal que morreu esses dias, abatida por um pulmão que não respondia mais.
outra notícia que me chegou ontem foi o infarte que dib lufti sofreu há poucos dias, atirando-o num CTI na esperança de que seu coração resista. e para quem não sabe, Dib, 70, é o diretor de fotografia mais importante do brasil, não por ter sido o olho de glauber rocha, mas por ter viabilizado em glauber uma estética sem a qual o próprio glauber partiria sem ter seu nome lembrado nem em almanaque de farmácia do subúrbio de cidade do interior do piauí...
07/03/2007
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Atenção
- G
- Nada encontrado. Seria ousadia demais definir o indefinível, dizer quem sou ou se sou. Deve ser uma miscelânia de idéias entrecortadas, salpicadas de perguntas sem respostas e indecisões doloridas. O que mais poderia ser?
Em suma...
"Em suma, namorei o diabo sem ter coragem para ir até o fim"
Sartre
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Um comentário:
Envolvente.
É o adjetivo que me ocorre no momento para esse texto delicioso (mais um adjetivo).
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